Espreito pela racha da porta velha
que o tempo carcomeu
e ouço, ao ritmo dos ponteiros,
o vento a entrar pela janela
despenteando-te a cabeça e os pêlos púbicos.
Imagino-te vulnerável sentada
à escrivaninha defronte da janela
por onde terás visto passar o tempo que te comeu.
Imagino-te e desejo chupar-te
os dedos que primeira e lentamente
mergulhaste na luz insossa do princípio
da tarde - e depois no tinteiro - e só então,
finalmente, com cuidado, dentro da minha boca.
E, abandonando-te, contemplo-te
na vasta solidão do ermo que uiva na noite de mim.