26 julho, 2009
demónios
hoje pintei a minha cara de branco e os lábios de
vermelho carmesim sombreei os olhos com rímel preto
e penteei o cabelo para trás usando os dedos
encharcados de tinta do sangue que corre nas
esferográficas deitadas nuas sobre a minha
secretária se eu a tivesse
............................................não é mentira
para pintar e para escrever nada mais uso
que os dedos e a língua e a imaginação
mas é verdade que hoje pintei a cara de branco
e os lábios de vermelho carmesim e que
sombreei os olhos com rímel preto e que
penteei o cabelo para trás depois ou antes
que importa olhei o espelho e vi reflectidos
sobre mim projectados no branco rugoso
da minha cara pantalha os demónios que desde sempre
me perseguem espantalhos de carne e osso mas
sem coração de asas estendidas num lago de baba
e saliva e fluídos seminais e vaginais
depois ou antes que importa limpei a alma
com um cálice de vinho tinto que sobrara
da noite anterior o tempo um dia para ser mais preciso
fizera crescer no líquido um doce aroma a morte e a solidão
limpei a alma
novamente e novamente e novamente e novamente e novamente
e sempre de um modo novo pela primeira vez
até que as rugas sangrassem e até que os meus
demónios adormecessem depois deitei-me a seu lado
e promiscuamente deitei a cabeça sobre o ombro de todos eles
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "nova alexandria",
Poesia
"O que faço?/
Sou músico./
O que toco?/
Poesia."