Escrevo-te para te dizer que gosto de te ouvir.
Apeteces-me de cada vez que me falas com essa tua voz lenta
e arranhada, metódica e precisa em todas as sílabas, impregnada de um certo perfume
preguiçoso das manhãs serôdias em que não nos atrevemos a sair do morno
aconchego das mantas.
A tua voz cheira-me à
doçura ácida das maçãs ainda por apanhar. Por detrás de cada palavra que dizes provo
o sossego suculento das pequenas dentadas num solarengo dia de primavera depois
de uma noite em que houvesse chovido a cântaros. Tu sabes como é, meu amor, o
cheiro molhado que se desentranha da terra sob o peso leve e morto das folhas
caídas aos nossos pés quando nós fechamos os olhos para melhor o saborearmos.
Posso sentir o teu hálito em cada vogal que arrastas pelas
frases com que passeias pelo meu corpo, o hálito quente e fresco da boca com
que me dizes que me queres. Gosto da te ouvir, paixão, mas é no silêncio do teu
sorriso que melhor te amo.