14 julho, 2010

Paisagem: República Canibal de Alexandria

Hoje quero soprar para longe de mim as canseiras

Que me tornam o corpo pesado e lasso, que me sujam

Os cabelos na lama e mos enrolam à volta dos braços

Como pulseiras. Nunca me pensei cativo do meu próprio

Corpo nem cárcere dos meus versos. Quero cantar o verão

Que morreu em mim, no interior do peito que já murchou.

Contar, pétala a pétala, as flores do mal que Baudelaire

Plantou no seu jardim. Quisera eu enrolar-me em tempos

No corpo do Diabo e enamorar-me dos poetas malditos,

E rebolar-me na sua tinta como uma virgem promíscua

E voraz que saltita de cama em cama, não sabendo

Muito bem o que procurar – se é que demanda

Algo mais que o mero prazer da descoberta morfo-carnal.

Aqui proclamo a República Canibal de Alexandria!

Soltem todos os gatos pretos à rua e deixem-nos procriar

Sob o tecto estrelado que Dalí poderia ter pintado – ou

Cozinhado como um ovo.

Soltem todas as serpentes e enviem-nas, na vez

Dos pombos-correio, entregar as boas-novas a todos

Os habitantes do Éden.

Soltem todos os corvos e façam-nos pintar o céu

Com a cor dos seus bandos.

Soltem todos os poetas, decreto eu!

E não se esqueçam de me deixar os portões do inferno bem abertos

(sim, sim, bem abertos como diabólicas mandíbulas

Emoldurando uma bonita e rapada vulva – dentro da qual

Se vislumbra o focinho de um torpe e peludo lobisomem),

Porque eu também descer pelo teu corpo abaixo – e adentro,

Bem adentro… – e brincar com os gatos que se escondem

Nas sombras dos teus recantos, e com as serpentes que dormem

Enroladas nos caracóis dos teus cabelos, e com os corvos que te voam

Pela tua negra alma afora, e com os poetas que tu assassinaste

– atravessando-lhes a alma com a ponta metálica e da tua pretoriana língua…

Anda, dá-me a mão e eu levo-te pelos círculos do inferno.

Dá-me o coração e eu espremo-te as vinhas da minha poesia

Para dentro da tua boca. Em troca, só te peço que me oiças,,

Oh Psicópatra:

Dá-me Roma inteira incendiada

Ou não me dês absolutamente nada!