30 outubro, 2008
Pelagus (II)
De olhar fixo no chão
Eratóstenes
Media o comprimento
Da sombra das suas varetas.
De olhar fixo no chão
Eratóstenes
Observava o universo
E calculava o
P_e__r___í____m_____e______t_______r________o
Da ambição humana.
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "Pelagus",
Poesia
23 outubro, 2008
S/título
Com a precisão cirúrgica
De um bisturi
A língua afiada
Grava
No relevo do osso limpo
A promessa
Inquebrantável
De unidade cósmica.
Mas o osso cede,
Parte-se
Como palitos,
Mil palitos
Em mil pedaços cada um
E escondidos.
Agulhas
No palheiro fechado
Da nevralgia humana.
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "Amanhã Chovi",
Poesia
16 outubro, 2008
Jerusalém Pela Manhã
Nasce o sol na sublimada Jerusalém
E em todos derrama sua luz mentecapta
Rebentando a manhã vinda do além.
A lente ateia do fotógrafo não capta
A verdadeira essência da religião
Ou as vidas sem culpa que uma bomba rapta.
O olho mecânico não fotografa a mão
Baptizada cristã ou a perna judia,
Nem sequer o braço temente ao Islão.
A lente apenas grava na fotografia
Um braço, uma mão e uma perna sem vida
E o resto dos corpos na calçada fria
Enquanto a voz de gargalhada suicida
Ecoa sonora pela Santa Cidade,
Certa de que a sua prece será ouvida.
Mas o que o mártir não sabe, em boa verdade,
É que morreu rezando a um deus que não o ouve
Pois sua existência é uma falsidade.
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "Versos Sem Sentido Consentido",
Poesia
15 outubro, 2008
Pelagus (I)
Na senda da notícia anterior a respeito do Prémio de Poesia Actor Mário Viegas, deixo no Amendual o primeiro poema dos mais de 30 que compõem o "Pelagus", sendo que os restantes serão certamente aqui publicados no futuro.
No pélago estelar
Voga a nova raça de navegadores
Pelos mapas astrais
Através de computadores
Na sua busca consonântica
De in-
-------completude
-------finita
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "Pelagus",
Poesia
Prémio Leya
Foi ontem anunciado o nome do vencedor do Prémio Leya, um jornalista e documentarista brasileiro chamado Murilo António Carvalho. Até aqui nada de estranho, uma vez que o Prémio pretendia divulgar a língua portuguesa (em qualquer um dos seus riquíssimos padrões). O que é estranho, em minha modesta opinião, é que para além da consequente publicação do romance vencedor , "O Rastro do Jaguar", apenas tenham sido (entre 422 obras finalistas, das quais o meu romance "A Noite Mais Escura" foi uma delas) propostas para edição mais 3 (julgo ser este o número) e, pasme-se, todas elas de autores brasileiros! Nem um português será publicado no rescaldo do Prémio Leya que, recorde-se, é um prémio literário que visa a promoção e divulgação da língua portuguesa, e que é patrocinado por um grupo empresarial português... Bem, as reacções já se fizeram ouvir pela blogosfera fora, por isso, não me parece que eu tenha algo a dizer a mais do que aquilo que já foi dito por outros bloggers bem mais lidos do que eu. Deixo apenas o desabafo: é pena que o senhor Miguel Paes do Amaral não tenha sabido fazer do Leya o mesmo que fez da TVI, uma máquina de produção portuguesa (alguém duvida que é no 4º canal que se faz a melhor ficção portuguesa, actualmente? - quando falo em melhor, estou obviamente a fazê-lo em termos de "venda do produto").
E por outro lado, será que queremos realmente vender a nossa obra ao mercado? Alguém já o disse, mais ou menos por estas palavras: há escritores que alcançam a fama em vida, há quem a alcance depois da morte; eu prefiro a segunda, é mais duradoira...
P.S.: terminado o "circo", vou arrumar as tralhas, que é como quem diz, reler novamente "A Noite Mais Escura", e vou começar a enviar a obra para as editoras; se ninguém a quiser, fica a promessa de a publicar aqui mesmo, no Amendual.
Prémio de Poesia Actor Mário Viegas
Soube-se esta semana que o Prémio Nacional de Poesia Actor Mário Viegas, patrocinado pelo Centro Cultural Regional de Santarém, foi ganho por Fernando Cabrita, um ilustre poeta e advogado da cidade minha vizinha Olhão que é possuidor de uma já vasta obra e, inclusivamente, de alguns prémios. Resta, aqui deste meu cantinho, e tendo inclusivamente concorrido ao Prémio com a obra "Pelagus", dar os sinceros parabéns ao homem e, especialmente, ao poeta! Que continue a deixar a marca das suas pegadas na vereda da poesia portuguesa contemporânea é o meu voto.
09 outubro, 2008
s/título
Escrevi um dia um poema transversal
Cujas rimas me atravessaram de lés-a-lés
O corpo ritmado pela lenga-lenga
Das sílabas tónicas mal acentuadas.
Sentei-me a ouvir uma chuva miudinha
Batendo gentilmente à porta
E esqueci-me totalmente de como era
O meu poema transversal…
Só sei que começava por mim
E tinha um verso a mais do que o canonicamente suposto.
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "Amanhã Chovi",
Poesia
02 outubro, 2008
Amanhã Chovi
Já reparaste que as estrelas são olhos,
Espiões,
Janelas indiscretas,
Através das quais os deuses do anonimato
Nos admiram e desprezam?
Já alguma vez realizaste um filme,
Mudo e a cores,
Ou sonoro e a p/b,
Em que tiveste a Visão, o Olfacto, o Tacto, a Audição e o Paladar
Por espect-actores?
Já assististe porventura a algum concerto
Dentro da tua cabeça
Cujo maestro
Fosse banda e coro e solista todos ao mesmo tempo
E ainda batesse palmas?
Já te deste conta de que somos humanos?
Só humanos?
Divinamente humanos?
E que nunca fomos feitos de barro mas sim de carne
E de sonhos?
Já algum dia olhaste para o vento e cheiraste a chuva
E sentiste que o vento
E a chuva
São os suspiros e as lágrimas de deuses pagãos
E ancestrais?
Já terás tu notado em alguma manhã de nevoeiro
Que o sol,
Que todos os dias nasce,
Fá-lo por ti, pela tua individualidade que é bela
Como raios de luz?
Terás já tu reparado que nasceste e que vives?
Ou fingirás, como eu,
Nascer e morrer
Todos os dias, trepando por um cordão umbilical
Feito de sensações inventadas?
O meu coração anseia pelo dia em que te possa
Segredar ao ouvido:
Amanhã chovi.
Engavetado em
Alexandre Homem Dual,
Op. "Amanhã Chovi",
Poesia
Nasceu o Amendual...
Aqui brota uma pernada do amendual. Uma pernada apenas que vencerá raízes e, espero, se fará tronco e mais tarde árvore autónoma por direito próprio. Autónoma mas sempre ligada à semente original que lhe dá origem: o labirinto de palavras em que me perco e me acho dentro de mim mesmo. De mim mesmo para um eu outro, para um outro: o mundo que me cerca, do(s) mundo(s) que eu cerco. E esta árvore dará frutos, dará amêndoas (que outro fruto poderia eu dar, eu que sou filho da minha terra, o Algarve do sol escaldante e do céu azul e do mar calmo mas também da lua libidinosa e do céu negro e do mar revolto?); e cada amêndoa será uma dádiva de mim para quem me leia, de mim para quem me tome o sabor dos versos ou da prosa. É pouca esta fundamentação? Pois faço minhas as palavras de um outro Alexandre, o O´Neill:
"É pouco como projecto? Em todo o caso, é o meu"...
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