13 abril, 2010

Inda He Inda He Indahehe


Os galhos dos salgueiros esticam os dedos na direcç
ão da praia

Onde dança a tua voz, confundindo-se com o som das ondas

E com o sabor da maresia; os salgueiros estão lá no morro de onde

Te espreito: descalça pisando as areias quentes sob os teus pés

– nua nadando por entre um mar de mescalina. Lá onde eu morro

Já antes de mim morreram outros, mil outros mais, diabos e anjos

Cujas ossadas foram já desfeitas pelo lento languidescer dos séculos

E pelo peso do teu corpo e da tua voz. Faço-te adeus, apesar de me

Não veres – aqui invisível aos teus olhos me prostro a morrer, acenando

O sol que se deita para lá do horizonte na tua cama. E os gemidos

Delicados das ondas que beijam a praia levantam das suas sepulturas

Os espíritos de todos aqueles outros que morreram já antes de mim:

Uma tribo de índios, uns velhos e outros novos, estes de peito duro

E castanho queimado pelo sol que reina alto, aqueles de peito mole

E castanho queimado pelas fogueiras à beira das quais se habituaram

A dançar. E dançando e cantando para lá da morte continuam:

Inda he inda he inda he indahehe! Inda he inda he inda he indahehe!

Ainda te ouço mas já te não vejo; o cântico dos índios ecoa pela tua garganta

– ou a tua presença pela garganta deles, quem sabe? Eu só sei que hoje é

Uma boa noite para morrer: por isso dançarei na companhia dos índios,

Promíscuos, felizes, ao som da tua cantiga de embalar.

E quando me deitar, tal como o sol se deita para lá do horizonte na tua cama,

Esticarei os meus dedos uma última vez e colherei um punhado

De folhas de um salgueiro dobrado pelo teu sopro (sim, eu sei que me esperas lá

Na linha do horizonte); e espalhá-las-ei, jogando-as ao ar, sobre o meu corpo

Nu e prenhe de música – e de imortalidade.